
Diz a lenda que acossada pela fome e necessitada de trabalho Billie Holiday entrou, uma certa noite de 1933, pelo Pod & Jerry adentro, candidatando-se a um lugar de bailarina. Não prestava. Mas o pianista responsável pela audição apiedou-se da rapariga e sugeriu-lhe cantar. A sua interpretação de Trav’lin All Alone comoveu. E garantiu mais do que um emprego.
Diz a lenda, mas outros relatos afirmam que a sua voz já podia ouvir em outro lugar de Nova Iorque, o Gray Down Club, no final de 1930 ou no início do ano seguinte. Tinha 15 anos. Lendas aparte, certo é a carreira de Billie Holiday dar um sério passo em frente quando o produtor John Hammond a ouviu e sobre essa experiência escreveu na sua coluna no Melody Maker, corria Abril de 1933. A rapariga negra, pobre, abandonada pelo pai e mal cuidada pela mãe, violada por vizinho, internada em casa de correcção, empregada de limpeza de um bordel e mais tarde prostituta estava finalmente no caminho de se tornar uma das mais valorosas e emocionantes e trágicas cantoras de sempre.
Mesmo não sendo a sua voz perfeita, porque de vez em quando a vida intromete-se no canto, tornou-se exemplar. E, como muito bem se pode ouvir ao longo do alinhamento de Lady Day – The Very Best of Billie Holiday, esta não é uma cantora de técnica. É melhor: Uma voz nascida directamente no coração que dá a temas tão distintos como Strange Fruit ou These Foolish Things ou Georgia On My Mind e I Love You, Porgy a característica única do seu talento talhado na dor que o consumo excessivo de heroína nunca apaziguou.
Até ao fim da vida, faz este ano meio século, Billie Holiday, acompanhada pela nata dos compositores e dos músicos norte-americanos (Lester Young, Duke Ellington, Benny Goodman e Count Basie são apenas exemplos), construiu um admirável e influente cancioneiro, uma obra luminosa que, como se experimenta em Lady Day – The Very Best of Billie Holiday, é um cofre a transbordar de pedras das mais preciosas.

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